Versos do averso

No sono mal dormido, nas vistas exaustas de apatia, nos versos do averso que paira sobre o ar: promessas do sol já não ardem mais em meu disforme coração que teimosamente pulsa sem menor sentido lógico. Ilógicas sempre foram as medidas que me guiaram sem rumo. As retinas incrédulas de novas voltas dos ponteiros a repetirem, como mantras, as dores que sequer estavam amanhecidas sobre a penteadeira. E ainda eram tantas e tantas. Queima-me por dentro uma chaga ainda sem cor, cheiro ou sabor, como um presságio de que os melhores dias estão para chegar. É o torpor em seu estado bruto. O esmaecimento diante do desespero banal de cada dia. Puro medo das sombras que insisto em percorrer como a velhos discos riscados. A saudade é ar!

Age como se ainda não percebesse que seu destino é moldado pelos ventos, sincronizados pelas leis que cria em seu coração a cicatrizar de dores futuras. E todo seu planejamento estratégico, raízes quadradas e demais invenções são meras historietas para se manter ébria em um mundo de cego valores tolos. Versos do averso que habito sem menor sentido. Ah! Os sentidos que me faltam para compreender as reinações dessas e outras vidas. Eu que tanto me orgulho da clarividência em minha alma adormecida: absolutamente nada disse. Fechei os olhos como a preparar a fraca carne da dor dilacerante que seguiria. Era o golpe fatal, mais uma vez. Ponto final.

Falta-me o perdão por fazer fogo e noite sem prévia autorização; burocracias que nunca me atentei. Pedaços de silêncios perdidos num universo opaco que reencontrei em seu sorriso jocoso. Perco as palavras exatas para entender sua lógica. Pouco ou nada restou para guardar dos vidros que vai pisando aos quais te vão moldando. Versos do averso que habitam em mim. O tiro passou-me ao lado. Foi por um triz. Eu tenho os dias contados, o rosto pregado: mantenha distância do pulsar descompassado do velho coração ainda imaturo para a incerteza das mudanças velozes e certas convenções irracionais. A vida e seus mistérios.

Guardo sob o travesseiro todos os sonhos que ainda me cabem do mundo. Ando tão lúcido quanto que estivesse à beira da morte certeira. Em que mais eu que hei de pensar? Dados do destino que bailam no ar antes de tocar no pano. Kant algum entenderia o que carrego apertado ao peito hipotético; demasiadamente o humano que nunca fui. Talvez, nunca o serei. De toda filosofia esculpida de seus lábios velados, a ausência de palavras desprovidas do mel das abelhas, dos frutos e da febre da paixão. Mantive o silêncio pelo medo remoto que de verdes, mares, montes e vales caíssem a teus pés. Então, fiz-me teu escudo da instabilidade lógica que estava prestes a explodir pelos ares. Feriu-me profundamente. Fiz em mim o que nunca serei. Não há mais metafísica nas palavras vazias e no desespero que me lanço sem lágrimas. Nos olhos momentaneamente cegos de terra, a aventura que recomeça com a sede que nunca sacia de quer viver tudo outra vez.

1 Resposta to “Versos do averso”


  1. 1 fátima falcão junho 12, 2021 às 11:43 am

    Puta que pariu! Texto belíssimo! Metáforas maravilhosas!
    Parabéns, Edu!
    Um abraço.

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